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Overcompliance criminal: O Risco do Excesso na Cultura da Integridade

  • Foto do escritor: Luis Vasconcelos Maia
    Luis Vasconcelos Maia
  • 16 de abr.
  • 2 min de leitura

Atualizado: 17 de abr.

O fortalecimento da cultura de compliance no Brasil decorre do avanço da responsabilização penal de pessoas jurídicas e da crescente demanda social por prevenção à criminalidade corporativa. Escândalos de corrupção, novas normas e acordos de leniência impulsionaram empresas a investir em sistemas internos de integridade. Contudo, esse movimento deu origem a um fenômeno preocupante: o excesso de compliance criminal (criminal overcompliance).


Nesse estágio, políticas internas excessivamente rígidas comprometem a atividade empresarial e os direitos individuais. A linha entre prevenção eficaz e excesso punitivo é tênue, e o direito penal deve estar atento ao desequilíbrio. A lógica do compliance, centrada na gestão de riscos jurídicos, passou em alguns contextos a ser substituída por um modelo de blindagem extrema, orientado pelo medo de sanções — ainda que remotas ou juridicamente frágeis — em detrimento da legalidade e da proporcionalidade.


Na prática, isso se traduz em bloqueios automáticos de pagamentos, paralisações contratuais por suspeitas infundadas, suspensões de operações, demissões sumárias e imposição de deveres sem respaldo legal. Em nome da integridade, impõem-se restrições que não seriam exigidas pelo próprio ordenamento jurídico.

A consequência é a internalização do medo como critério de gestão. Empresas passam a agir com base em antecipações defensivas, gerando elevação de custos, insegurança nas relações e esvaziamento da função gerencial, substituída por contenção institucional.


A racionalidade penal exige que o risco jurídico seja analisado sob a ótica da legalidade e da culpabilidade, não da autopreservação irracional. O overcompliance distorce os critérios de imputação penal e fragiliza garantias fundamentais — inclusive dentro das empresas. Não raramente, em investigações ou negociações, departamentos jurídicos adotam posturas defensivas desmedidas, aplicam sanções sem o devido processo, fornecem documentos sem crítica ou promovem demissões simbólicas. Tais práticas, longe de proteger, podem comprometer a posição jurídica da empresa e de seus representantes.


A advocacia criminal especializada deve atuar com cautela técnica, delimitando riscos penais concretos e construindo políticas internas conformes à legalidade, inclusive quanto aos limites do poder punitivo privado. O objetivo não é enfraquecer a integridade, mas submetê-la ao controle jurídico próprio de um Estado de Direito.

O zelo excessivo, quando dissociado de fundamentos legais, pode levar a violações de garantias, produção de provas contra a própria empresa ou assunção indevida de responsabilidades. A antecipação à sanção, nesse cenário, deixa de ser prevenção e se torna autoincriminação institucional.


A relação entre overcompliance e acordos de colaboração ou leniência também merece atenção. Vincular a boa-fé da empresa à adoção de medidas autossacrificiais, sem devido processo, distorce o sentido da colaboração eficaz, que não pode equivaler à renúncia de direitos.


A defesa estratégica deve conter os excessos e restabelecer critérios objetivos de responsabilização, impugnando condutas internas ilegais, orientando posturas frente a investigações e delimitando a colaboração nos marcos legais — sempre com base jurídica sólida, não apenas em expectativas de mercado.


Overcompliance não é integridade: é a institucionalização do medo sob o disfarce do zelo. Empresas que desejam responsabilidade penal genuína precisam compreender que conformidade também se submete à legalidade, à proporcionalidade e à preservação de sua identidade institucional.


Se sua empresa está exposta juridicamente e revê ou implementa políticas de compliance em meio a investigações ou reestruturações, é essencial contar com orientação técnica e estratégica. O excesso de cautela, sem fundamento jurídico, pode ser tão danoso quanto a omissão.

 
 
 

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